DIREITOS HUMANOS PARA AS PESSOAS DE BEM, CADEIA PARA OS BANDIDOS

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sexta-feira, 10 de junho de 2016

BOM DESPACHO Três servidores públicos são acusados de estupro coletivo

Universitária de 19 anos diz ter sido atacada após festa de confraternização de congresso

   
  Uma semana antes, a estudante Maria*, 19, de Belo Horizonte, postava em sua rede social uma mensagem indignada com o estupro coletivo de uma adolescente no Rio de Janeiro. Dias depois, foi ela que se viu acordar nua em um quarto de hotel com três homens seminus, após uma festa universitária, e gritar: “quem vocês acham que eu sou?”, correndo para o banheiro em seguida. Ela só teve coragem de denunciar a violência cinco dias depois. Na tarde dessa quinta-feira (9), a Polícia Civil pediu a prisão dos três suspeitos, dois de 24 anos e um de 25 anos, todos servidores públicos do Estado, ex-alunos da Fundação João Pinheiro (FJP), onde Maria estuda administração pública. Até a noite dessa quinta-feira (9, a polícia não havia encontrado nenhum dos três.



“Não foram traficantes dessa vez, eram pessoas instruídas, com nível superior, cargos públicos, um deles é chefe na Cidade Administrativa. Não dá para entender. Quando começa de um lado, outros casos se revelam e parece que sai espalhando”, lamentou o pai de Maria, que ainda nessa quinta não conseguia conter o choro ao falar sobre o crime: “Nunca senti dor igual. Uma revolta, sentimento que nunca tive na vida. Minha filha mais velha, estudante, dedicada. Eu a levo para a faculdade todos os dias, cuido dela”, completou.

O abuso. O crime aconteceu há uma semana, em uma pousada em Bom Despacho, na região Centro-Oeste, durante o II Encontro Mineiro dos Estudantes do Campo de Públicas, organizado pelos alunos da FJP, mas que reunia estudantes de outras universidades. Um dos suspeitos seria palestrante do encontro.

Conforme a delegada Danúbia Quadros, chefe da Divisão Especializada de Atendimento à Mulher na capital, Maria relatou ter “ficado” com um dos rapazes na festa e, após beber muito, acordou no quarto, de bruços, nua, e foi virada por um dos homens.

“Duas testemunhas presenciaram a vítima saindo do quarto, usando a camisa e a saia, e também viram os três rapazes”, disse a delegada. Segundo ela, as investigações ainda estão em curso. Além dessas duas pessoas, outras seis que estavam na festa já foram ouvidas, entre elas os organizadores. “Por ela estar desacordada, (o crime é considerado) estupro de vulnerável, com aumento de pena pelo concurso de mais pessoas”, explicou Danúbia.

“Quero que haja justiça para que outras tenham coragem de denunciar. Não é um estupruzinho de uma turminha que resolveu beber. São criminosos”, salientou o pai da vítima. Maria também quer punição. “É horrível esse desprezo, essa banalização, e aconteceu comigo. Vou me tornar servidora também. Não quero ter que conviver pelo resto da vida com eles”.
* nome fictício

Assédio
BH. Um homem de 39 anos foi detido após puxar o braço de uma jovem, de 19, e beijá-la à força na praça da Liberdade. Segundo a PM, ele disse a ela ter visto que ela queria “sexo selvagem”. Ele foi ouvido e liberado.
A legislação
Desde 2009, a lei considera estupro qualquer ato com sentido sexual sem consentimento, inclusive um toque. A pena é de seis a dez anos de prisão. Mas é aumentada para até 12 anos se a vítima for menor de idade. Se for vulnerável (menor de 14, com problema mental ou se estiver desacordada), a máxima é de 15 anos. 

Mudança. Após o estupro coletivo de uma menor no Rio de Janeiro, o Senado aprovou no dia 31, o Projeto de Lei 618/2015, que tipifica os crimes de estupro coletivo e de divulgação de cena de estupro, que não eram previstos no Brasil. A pena hoje é aumentada para até 12 anos e meio, e a proposta é ampliar para mais de 16 anos. O texto precisa ser votado na Câmara Federal.

Inquérito. A polícia tem 30 dias para concluir o inquérito. Na quarta-feira (8), a vítima, moradora de Belo Horizonte, fez exame de corpo de delito, mas o resultado pode estar comprometido, por causa do tempo que se passou do crime. “Um familiar dela sofreu estupro no passado, e ela não queria trazer à tona essa lembrança, por isso demorou para denunciar. Ela chegou aqui chorando, nervosa e pedindo justiça”, disse a delegada.

Congresso. Em Brasília, o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) foi alvo de vaias ao defender, em audiência na Comissão de Direitos Humanos da Câmara, que não existe uma cultura de estupro no Brasil. Para ele, o que existe é uma “geração delinquente” e uma “erotização precoce”.
Envolvidos podem perder cargos, informa CGE
A Controladoria Geral do Estado (CGE) informou que irá instaurar uma sindicância para apurar a participação dos três servidores públicos no estupro coletivo de Bom Despacho. Caso sejam confirmados o crime e a autoria, será iniciado um processo administrativo disciplinar e eles podem inclusive perder seus cargos.

O presidente da Fundação João Pinheiro, Roberto Rodrigues, informou, em nota, que repudia atos de violências contra membros da instituição. “É com esse espírito que a instituição se manifesta veementemente contrária aos casos de violência e constrangimentos denunciados recentemente”.
A nota diz ainda que os fatos estão “sendo apurados pelos órgãos competentes” e que os “procedimentos cabíveis” de apoio à vítima estavam sendo tomados pela instituição. (JS)

‘Não posso aceitar que a vítima pague’
Em um primeiro momento, Maria conta que sentiu medo de falar sobre o estupro que sofreu, mas ao contar para amigas da faculdade que lutam contra a cultura do estupro, ela chegou à conclusão de que só uma denúncia formal poderia surtir algum efeito. Casos como o dela já aconteceram outras vezes em festas na Fundação João Pinheiro – há pelo menos cinco relatos e só dois foram denunciados, segundo Maria. “Tem que acabar esse desrespeito. Não posso aceitar que a vítima continue pagando sozinha, remoendo e lutando sozinha. Ninguém pede para passar por isso”, desabafou Maria, que assim como o pai, não continha o choro.

Os dois pediram anonimato para não se expor ainda mais. Na FJP, porém, todos já sabem o que ocorreu com ela. De qualquer modo, ela implora para que o caso não se limite a uma fofoca. “O mínimo que mereço é conseguir me formar, amo minha faculdade, não quero parar”, afirmou. (JS)
Nota da Comissão Organizadora 
A Comissão Organizadora do II Encontro Mineiro de Estudantes do Campo de Públicas repudia de forma veemente quaisquer tipos de abuso sejam eles, físicos, sexuais ou psicológicos e lamenta profundamente o fato ocorrido e denunciado por uma de nossas congressistas. Desde que tomamos ciência da denuncia realizada a Delegacia de Mulheres, nos colocamos a inteira disposição das autoridades competentes no intuito de cooperar para as investigações, e caso comprovado, a punição dos envolvidos. Fatos como esse não refletem o perfil dos estudantes do Campo de Públicas Mineiro que buscaram no evento a oportunidade de participar de palestras e debates em prol da profissionalização do nosso campo de atuação. Por fim, reafirmamos nosso compromisso com a verdade e com a resolução dos fatos, sempre lutando por uma sociedade mais justa e livre de abusos de qualquer natureza.
Redação: O Tempo

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