Palácio do Planalto disse que reportagem é "escandalosa, leviana, sexista, covarde e risível"
Matéria da revista IstoÉ dizia que a presidente Dilma Rousseff estaria passando por "sucessivas explosões nervosas"Dida Sampaio/16.03.2015/Estadão Conteúdo |
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"Uma peça de ficção". Foi dessa forma que o Palácio do Planalto qualificou a reportagem de capa da revista IstoÉ desta semana, segundo a qual a presidente Dilma Rousseff sofre de "sucessivas explosões nervosas", está "mais agressiva do que nunca" e perdeu "as condições emocionais para conduzir o país".
Em nota publicada no final de semana, a assessoria da presidente disse que a reportagem é "escandalosa, leviana, sexista, covarde e risível" e afirmou que a Justiça será acionada no caso.
— Fazer isso seria tratar como jornalismo o que não é; seria conferir respeito ao que, no fundo, é inqualificável; seria pensar que algo ali pode ser crível e confiável, o que está muito longe de ser.
A reportagem, assinada pelos repórteres Sérgio Pardellas e Débora Bergamasco, afirma que Dilma está passando por "sucessivas explosões nervosas" e que a presidente estava sendo medicada com dois remédios: Rivotril e Olanzapina — usados por pacientes que enfrentam doenças psicológicas.
Segundo a publicação, "não é exclusividade de nosso tempo e nem de nossas cercanias que, na iminência de perder o poder, governantes ajam de maneira ensandecida e passem a negar a realidade".
A reportagem cita os estudos do psiquiatra britânico Francis Willis, que "se especializou no acompanhamento de imperadores e mandatários que perderam o controle mental em momentos de crise política".
Seus métodos, contudo, não teriam funcionado "com a paciente Maria Francisca Isabel Josefa Antónia Gertrudes Rita Joana de Bragança, que a história registra como 'Maria I, a Louca'".
"O psiquiatra observou que os sintomas de sandice e de negação da realidade manifestados por Maria I se agravaram na medida em que ela era colocada sob forte pressão. 'Maria I, a Louca', por exemplo, dizia ver o 'corpo' de seu 'pai ardendo feito carvão', quando adversários políticos da Casa de Bragança tentavam alijá-la do poder. Nesses momentos, seus atos de governo denotavam desatino, como relatou doutor Willis: 'proibir a produção de vinho do Porto na cidade do Porto'. Diante desse quadro, era preciso que ocorresse o seu 'impedimento na Coroa'", diz a publicação.
A revista afirma que Dilma está ainda mais agressiva com seus subordinados. "Desde o primeiro mandato de Dilma, um importante assessor palaciano dedicou-se a registrar num livro de capa preta as reprimendas aplicadas por Dilma em seus subordinados. Ele deixou o governo recentemente por não aturar mais os insultos da presidente. A maioria injustificável, em sua visão. No caderno, anotou mais de 80 casos ocorridos entre 2010 e 2016. Entre eles, há o de um motorista que largou o automóvel presidencial no meio da Esplanada dos Ministérios depois de ser ofendido compulsivamente pela presidente e ameaçado de demissão por causa de um atraso. 'Você não percebeu que não posso atrasar, seu m... Ande logo com isso senão está no olho da rua', atacou Dilma".
Segundo a publicação, "consta também das anotações os três pedidos de demissão de Anderson Dornelles, que deixou o Planalto no último mês sob fortes suspeitas de ser sócio oculto de um bar localizado no estádio Beira-Rio de propriedade da Andrade Gutierrez. Nas vezes em que ameaçou deixar o governo, alegou cansaço dos destratos da presidente. 'Menino, você não faz nada direito!', afirmou ela numa das brigas".
Até o ex-ministro da Justiça e atual ministro da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo, "também já experimentou a fúria da presidente", continua a publicação. "A irritação, neste caso, derivou das revelações feitas pelo empresário Ricardo Pessoa, da UTC, sobre as doações a sua campanha à reeleição em 2014. Participaram dessa reunião convocada pela presidente, além de Cardozo, os ministros Aloizio Mercadante, Edinho Silva e o assessor especial Giles Azevedo. Na frente de todos, Dilma cobrou Cardozo por não ter evitado que as revelações de Ricardo Pessoa se tornassem públicas dias antes de sua visita oficial aos Estados Unidos, quando buscava notícias positivas para reagir à crise. 'Você não poderia ter pedido ao Teori (Zavascki) para aguardar quatro ou cinco dias para homologar a delação?', perguntou Dilma referindo-se ao ministro que conduz os processos da Lava Jato no STF. 'Cardozo, você fodeu a minha viagem ', bradou a presidente".
Reação
A edição da revista caiu como uma "bomba" nas redes sociais, levantando debates acalorados. No Twitter, a hashtag #IstoÉmachismo entrou para a lista dos assuntos mais comentados do dia.
As ministras Nilma Lino Gomes, que comanda o ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, e Eleonora Menicucci, que está à frente da Secretária de Políticas para as Mulheres, gravaram um vídeo criticando a postura da revista.
Nilma Gomes disse que se sente honrada de estar no governo da primeira mulher presidente do Brasil e critica a reportagem.
— Estereótipos de gêneros sempre foram usados para tentar atingir a dignidade e a importância das mulheres. Não passarão, isso é machismo. Isto é violência de gênero.
Eleonora Menicucci criticou a IstoÉ e disse que a resposta para isso é mais igualdade de gênero.
— Isto é sexista, isto é machista, isto é golpista. Somos contra todo tipo e qualquer violência contra as mulheres, principalmente quando essa violência se abate contra a presidenta da República.
A União Brasileira de Mulheres de Santa Catarina disse em sua conta no Facebook que a revista reforçou estereótipos sobre as mulheres.
— Isto É invoca e reforça o estereótipo machista de que as mulheres são descontroladas emocionalmente, irracionais, e, consequentemente, não estão talhadas para o exercício do poder político.
O coletivo feminista ThinkOlga, famoso pela campanha "Chega de fiufiu", também publicou um texto de repúdio e acusou a revista de estar praticando "GashLighting" que é uma violência emocional baseada na manipulação psicológica que leva a mulher e todos a seu redor acharem que ela enlouqueceu ou é incapaz.
— Em meio ao conturbado momento político que vivemos, essa é uma estratégia baixa e covarde para convencer a população de que Dilma não é confiável para estar no comando da nação por problemas psicológicos.
O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) também usou sua conta no Facebook para criticar a reportagem.
— O apelo desesperado à misoginia feito pela Revista ISTOÉ na capa da sua atual edição é muito grave e, não por acaso, está em perfeita sintonia com os discursos machistas que a oposição de direita faz diariamente no parlamento e que são de embrulhar o estômago.
Autora da matéria já foi vítima do machismo
Uma das autoras da reportagem, a jornalista Débora Bergamasco, já foi alvo de críticas machistas neste ano. O motivo foi a capa da revista que vazou as delações de Delcídio do Amaral.
Um texto publicado no Diário do Centro do Mundo acusava a jornalista de ter conseguido o “furo” por ser amante de um homem próximo ao governo Dilma.
Um coletivo de mulheres que trabalham com audiovisual gravou um vídeo criticando a postura da Revista IstoÉ.
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